Carro elétrico: o conflito entre os interesses privado e público

A quem interessa o advento do carro (particular) elétrico? Sem meias palavras, interessa à ideologia do transporte individual e do interesse privado.

Essa ideologia (que tem  como referência os EUA e Japão) olha para o caos urbano diário na cidade de São Paulo e só vê algumas consequências danosas como a poluição atmosférica decorrente dos cinco milhões de automóveis vomitando gigantescos volumes de CO2 durante cinco horas por dia.

Porque essa ideologia quer o automóvel elétrico? Para que as pessoas possam continuar “entulhando” as vias urbanas, sem sentimento de culpa, com um meio de transporte privado, já que essa ideologia prega a liberdade total de uso do transporte individual, como um valor básico da nossa sociedade.

Porque essa ideologia não prega a necessidade de caminhões e ônibus movidos a eletricidade? Porque ela não está preocupada com os não-incluídos ou apenas não-demandantes. Ela representa e verbaliza, exclusivamente, os interesses privados.

Somente a ideologia do transporte coletivo e de massa (que tem como referência os países nórdicos e alguns europeus como a Inglaterra e França) olha para uma cidade como São Paulo e vê que é inviável ter-se cinco milhões de automóveis ocupando o espaço viário que deveria ser ocupado, prioritariamente, por caminhões, ônibus, motos e bicicletas. Essa ideologia sabe – inclusive baseada na Constituição Federal – que o interesse privado tem que se subordinar ao interesse público.

O Brasil já tem combustível pouco poluidor (etanol). Desse ponto de vista a situação estará bem resolvida quando se puder atender à quase totalidade de demanda razoável pelo uso de transporte individual.

Do ponto de vista do interesse público, esse combustível (etanol) também gera trabalho e renda para milhares de brasileiros e respectivas receitas para pequenas e médias cidades produtoras.

Assim, está correto o governo brasileiro ao não estimular a fabricação de carros elétricos e sim a dos veículos flex (gasolina e etanol).

Caberá aos prefeitos e prefeitas disciplinar o uso das vias urbanas, para garantir a prioridade do transporte coletivo, o que, inevitalmente, implicará em penalizar o transporte individual.

Os países nórdicos e a Inglaterra já instituiram o pedágio urbano como forma de desestimular o uso de transporte indivual, aliado às restrições de estacionamento nas áreas de grande concentração. Mais cedo ou mais tarde, cidades como São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Brasília vão ter que fazer esse dever de casa.

Voltando à tecnologia de fonte elétrica (bateria) para veículos automotores, eu defendo o desenvolvimento de pesquisas para utilização de energia elétrica em ônibus. Isso sim seria um avanço, onde se matariam várias bactérias com um só antibiótico, resultando em mais transporte coletivo, menos poluição atmosférica e sonora e, além de tarifas módicas.

Essa me parece uma luta importante. E você, o que acha?

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Serra passa de vidraça a estilingue

Ontem, a Folha de São Paulo publicou matéria mostrando o elevado grau de deterioração das rodovias estaduais e vicinais em São Paulo. O alvo dessa matéria é o ex-governador José Serra, responsável pela situação, detectada no período 2007-2010.

O T1 publicou essa matéria e uma análise de minha autoria em que mostro que as rodovias de São Paulo são as melhores e as piores do país. As melhores, aquelas que o usuário paga elevado pedágio. As piores, aquelas de responsabilidade do governo do estado.

Em vez de defender-se das acusações do TCE-SP, ou mostrar que a matéria é falsa, o agora candidato José Serra trocou a camisa de vidraça pela de estilingue (atiradeira para os cariocas), atacando o governo federal, com crítica ao estado de conservação das estradas federais, especialmente em Minas.

Serra não leu a última pesquisa rodoviária da CNT (2009).

A pesquisa, realizada em 2009 e divulgada em 28/10/09 (clique aqui para ler o Relatório Gerencial da pesquisa), mostra o seguinte quadro, em relação aos 87.552 quilômetros avaliados:

Pavimentação (págs. 32 a 35, do Relatório Gerencial):

  • 94,3% não apresentam buracos (87,1% em 2007);
  • A condição do pavimento não obriga a redução de velocidade em 95,3% da malha (86,4% em 2007);
  • 83,3% dos pavimentos dos acostamentos estão em boas condições (73,2% em 2007);
  • Em 2007, 94,4% dos pavimentos não apresentavam pontos críticos. Em 2009, não foi feita essa avaliação.

Obs.: A CNT não fez a pesquisa em 2008, daí compararmos com 2007

Sinalização (págs. 36 a 44):

  • Pinturas das faixas centrais com boa visibilidade: 75,4%
  • Pinturas das faixas laterais com boa visibilidade: 64,3%
  • Placas existentes de sinalização de limites de velocidade: 70,2%
  • Placas existentes de indicação: 68,5%
  • Visibilidade das placas: 73,4%
  • Legibilidade total das placas: 64,8%

Considerando apenas os números relativos à pavimentação e à sinalização, a pesquisa CNT 2009 mostra que a malha rodoviária nacional (federal e estaduais, concedidas e com operação estatal) melhorou muito nos últimos anos. Graças aos elevados investimentos realizados pelo governo federal, pelas concessionárias e pelos governos estaduais, via recursos próprios e via repasses da CIDE.

Serra também critica a utilização da CIDE, esquecendo que o Estado de São Paulo é o principal beneficiado pelo repasse dos 29% do que a União arrecada com a CIDE. Os números e os fatos mencionados pelo candidato, em relação à CIDE são falsos. O governo federal, desde 2006, vem investindo na malha rodoviária muito mais do que arrecada com a CIDE.

Como a malha rodoviária nacional melhorou muito, e como o modal rodoviário é o de maior participação na matriz de transporte de cargas, foi possível ao Brasil crescer significativamente, de 2002 para cá. Fundamentaremos a seguir o que estamos afirmando neste parágrafo.

A partir de 2002, a corrente de comércio exterior quase triplicou, passando de cerca de US$ 100 bilhões em 2002 para cerca de US$ 280 bilhões em 2007. A quantidade de contêineres (cargas de maior valor agregado) aumentou 2,5 vezes, passando de cerca de dois milhões, em 2002, para cerca de cinco milhões, em 2007.

Essas cargas chegaram aos portos, em grande parte, através de caminhões e trens. Se houve esse crescimento, em apenas cinco anos, significa que as exportações e importações fluíram e tinham custos logísticos adequados para se tornarem competitivos e atraentes, ainda que possam ser menores, no futuro.

Serra também procurou relacionar a situação crítica das estradas (que é falso, segundo a pesquisa da CNT) com aumento dos acidentes.

Quanto a relacionar acidentes com situação precária das estradas, o candidato deveria ler a pesquisa do IPEA sobre custos de acidentes rodoviários, realizadas pelo órgão, em parceria com o Denatran e execução da UnB. Essa pesquisa, publicada em 2006, diz duas coisas importantes, que desmontam essa tese:

  • As rodovias estaduais de São Paulo são consideradas as melhores do país. Entretanto, lideram o ranking de custo anual de acidentes, com R$ 3,3 bilhões.
  • Grande parte dos acidentes fatais em rodovias ocorrem durante o dia, com boa luminosidade, sem chuva ou nevoeiro, em retas e em pisos com boa qualidade.

Enfim, Serra defendeu-se atacando, mas a realidade está à vista de todos e todas e retornará na Pesquisa Rodoviária da CNT, a ser divulgada em breve.

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Rodovias paulistas: as melhores e as piores do país!

Nas pesquisas rodoviárias da CNT, as rodovias paulistas aparecem como as melhores do país. Qual a característica central dessas estradas? São todas pedagiadas!

Então, como é de se esperar, e considerando o tipo de relêvo do Estado de São Paulo, todas as rodovias pedagiadas – estaduais e federais – são boas ou ótimas.

Entretanto, as demais rodovias estaduais e municipais de São Paulo estão entre as piores do país. É o que diz o relatório do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo TCE/SP, apresentado na matéria da Folha de São Paulo e reproduzida aqui neste T1 (clique aqui).

Esse relatório mostra que obras de manutenção naquelas rodovias não duram sequer um ano.

Alguém poderá dizer: mas são apenas as estradas vicinais…

Só quem não conhece São Paulo pensa que os caminhões, com suas cargas agrícolas e industriais, somente circulam nas estradas pedagiadas. É claro que não! Porisso as rodovias vicinais têm uma importância tão grande para a economia daquele estado.

Há insuficiência de recursos financeiros?


São Paulo tem uma peculiaridade: praticamente todas as rodovias estaduais concedidas pagam um elevado valor de outorga que deveria ser aplicado nas demais rodovias estaduais e municipais.

Além disso, o Governo do Estado de São Paulo tem o segundo maior orçamento do país, perdendo apenas para o da União. Logo, não deveriam faltar recursos orçamentários para a manutenção e restauração dessas rodovias.

Finalmente, quase ninguém sabe mas a União transfere ao Estados e municípios – o grosso é para os estados – 29% do que arrecada com a CIDE – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, que todos pagamos quando abastecemos nossos veículos.

O Estado de São Paulo – e municípios – é o que recebe a maior fatia da CIDE (já chegou a R$ 300  milhões/ano).

Há quem diga (eu não acredito nisso) que as rodovias estaduais não pedagiadas são mantidas em más condições de trafegabilidade para forçar os motoristas a irem para as pedagiadas. Acho muito fantasiosa essa versão, embora não de todo absurda.

Como se explica, então, que o estado mais rico do país, e com tantos recursos financeiros disponíveis, tenha uma malha rodoviária de estaduais e vicinais em más condições de tráfego e segurança, como diz o Relatório do TCE/SP?

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Diretrizes de governo da candidata Marina Silva esquecem da logística e dos transportes

Abri o documento apresentado no site da candidata (clique aqui), usei a palavra-chave transportes e encontrei apenas o seguinte:

1. Diagnóstico “Ampliação do Caos Urbano”

“Nas cidades, o tempo gasto no trânsito já chega a 2,6 horas por dia, e a distância percorrida cresce continuamente por aqueles que utilizam transporte público.”

2. Proposta de medidas em relação à infra-estrutura

“Nos sistemas de transporte, a ênfase deve ser dada às ferrovias, às hidrovias e aos sistemas híbridos, combinando biocombustíveis e eletricidade.”

3. Preparação para os grandes eventos

“A realização de grandes eventos, como a Copa do Mundo, a Olimpíada e a Convenção Internacional Rio + 20, deve ser encarada como uma importante oportunidade para projetar a imagem de um país que tem a sustentabilidade no eixo central de seu desenvolvimento, ao mesmo tempo que deixará uma ampla gama de investimentos em infraestrutura urbana como legado para a melhoria de qualidade de vida dos brasileiros. Neste sentido é fundamental criar força-tarefa para otimizar planos e investimentos, e garantir a instalação de sistemas de transporte público e saneamento nas cidades-sede.”

4. Estímulo à geração de empregos verdes

“São os empregos calcados em uma economia sustentável, proporcionando trabalho decente com baixo consumo e emissão de carbono. Os setores de maior potencial no Brasil são a construção civil, a indústria, o turismo, a geração de energias limpas, seguras e renováveis, o transporte, a agropecuária e o uso sustentável dos diferentes biomas (particularmente das florestas). Eles precisam ser estimulados por meio de instrumentos fiscais, tributários e creditícios.”

5. Mobilidade urbana saudável

Reordenar e direcionar os investimentos e subsídios em transportes de forma a orientar e estruturar o crescimento e mobilidade nas cidades, visando sistemas adequados aos diferentes tamanhos e tipologias de cidades existentes no território.

Criar incentivos e inserir nos critérios de financiamento o estabelecimento de instituições reguladoras de transportes coletivos em regiões metropolitanas e aglomerados urbanos (integrar modais, otimizar frotas e itinerários, reduzir tempo de viagens, entre outros). Incorporar a bicicleta como meio de transporte e criar condições para seu uso seguro (ciclofaixas, ciclovias, ligações intermodais).

***

É só!

De todos as candidatas e candidatos, este talvez seja o programa de governo mais anêmico no que se refere às enormes necessidades de aumento da eficiência e da eficácia dos sistemas de transportes e da logística, para o crescimento sustentável do país.

Ainda mais que o PV e os ambientalistas mais radicais são extremamente críticos em relação às grandes obras de infra-estrutura de transportes.

As diretrizes apenas tocaram de leve nas questões relativas aos municípios e regiões metropolitanas, sem mencionar qualquer proposta ou diretriz para os modais rodoviário, ferroviário, aeroviário, dutoviário, portos, hidrovias e aquaviário. Utilizei cada uma dessas palavras na procura e nada…

Entrei com a palavra-chave “logística” e não encontrei referência alguma.

Ou seja, um dos principais temas da campanha – a logística e a infra-estrutura de transportes – não foi abordado nas diretrizes de programa de governo da candidata Marina Silva, a não ser, levemente, na área urbana.

É uma pena, pelo empobrecimento do debate, já que palavras de ordem como sustentabilidade e meio-ambiente são insuficientes para o eleitor entender a proposta de cada candidato em relação ao desenvolvimento econômico e social, ambientamente sustentável.

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Frota de caminhões: renovar ou renovar

Até parada para atualização do RNTRC – Registro Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas, na ANTT, tínhamos que, do total de caminhões de autônomos registrados, 650 mil eram caminhões simples. Ou seja, 66% dos caminhões de autônomos registrados têm idade média de 23,2 anos.

Essa frota de caminhões dos autônomos é a que mais polui, mais consome combustível, mais se acidenta e tem maiores custos operacionais. Em suma, é ruim para o país, para o sistema de transporte de cargas e para os próprios motoristas autônomos. Além disso, essa frota percorre maiores distâncias e é obrigada a transportar excesso de peso para aumentar um pouco mais a receita mensal.

Esse quadro desolador é incompatível com o patamar que o nosso país está vocacionado a assumir, brevemente, de país desenvolvido. Após a recuperação da malha rodoviária nacional, promovida pelos governos federal e estaduais, chegou a vez da busca de maior eficiência no transporte rodoviário de cargas. É impossível alcançar o patamar desejável com um milhão de caminhões com idade média superior a 21 anos.

Quando Secretário de Política Nacional de Transportes (2004-2007), debati com todas as entidades representativas do transporte rodoviário de cargas o que poderia ser um programa de renovação da frota de caminhões, que permitisse uma evolução gradativa, para redução significativa da idade média da frota de caminhões.

Fez parte desse consenso o estabelecimento de algumas condições, voltadas ao aumento da eficiência do setor:

  • Estabelecer benefícios ou financiar caminhão novo e usado somente para aqueles que comprovem transportadores;
  • Estabelecer restrições de acesso a qualquer benefício destinado a transportadores que tenham atingido um dado limite de multas por excesso de peso ou por excesso de velocidade;
  • Estabelecer incentivos, condicionando o acesso aos mesmos, em função da qualidade, da segurança e de características de poluição a serem respeitadas;
  • Aumentar o rigor nas inspeções veiculares;
  • Fomentar o sucateamento de veículos com mais de 35 anos de uso, reduzindo gradativamente esse limite.

Quanto às condições financeiras, inclusive das garantias a serem oferecidas pelo tomador do empréstimo, as mesmas foram negociadas, junto a Diretoria do BNDES, com a efetiva participação das lideranças do setor de transporte rodoviário de cargas.

O projeto lançado pelo BNDES, denominado Pró-Caminhoneiro, financiando veículos usados com até 15 (quinze) anos de idade, decorreu dessas negociações. Este projeto, lançado em 19 de junho de 2006, encontra-se em desenvolvimento, mas ainda é insuficiente para atender à real necessidade de renovação.

O Projeto Pró-Caminhoneiro tem as seguintes peculiaridades:

  • Apresenta taxa atrativa de juros
  • Permite prazo de carência de até 6 meses e de amortização de até 96 meses
  • Inclui financiamento para veículos com até 15 anos de fabricação
  • Inclui financiamento de sistemas de rastreamento novos (aumento da segurança)
  • Inclui financiamento do seguro do bem e seguro prestamista, quando contratados em conjunto com os bens
  • Participação de até 100% do valor do bem
  • Garantia negociada entre a instituição financeira credenciada e o cliente
  • O transportador autônomo deverá ser registrado no RNTRC

O Governo Federal precisa retomar esse esboço de programa discutido com as entidades, identificar os diversos órgãos que têm que participar do mesmo e definir um modelo de financiamento que estimule o autônomo a trocar seu caminhão por um mais novo. No México, há um programa desse tipo que oferece crédito a quem sucatear seu caminhão no ferro-velho, que será utilizado como parcela do valor de compra de veículo mais novo. Pode ser uma boa alternativa.

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Trem-bala: os europeus e asiáticos são burros e irresponsáveis

É a conclusão que se pode inferir da saraivada de críticas ao projeto do Trem de Alta Velocidade (TAV), também conhecido como “trem-bala”, ligando o Rio a São Paulo e Campinas.

Esse tipo de solução (TAV) está em expansão nesses dois continentes, tanto nos países desenvolvidos como nos emergentes, similares ao Brasil.

Boa parte da imprensa e o candidato José Serra são contra esse projeto. Chegou a dizer, ontem (16/7), que o governo federal deveria utilizar esse dinheiro para os sistemas de metrô e esquecer do TAV.

Aliás, o candidato acredita tanto nisso que, durante o governo Fernando Henrique, ajudou a desativar as viagens regionais de passageiros por trem, como o remanescente do desmonte do modal ferroviário, o Trem da Prata (Rio-São Paulo), cuja última viagem foi em novembro de 1998.

O argumento para esse desmonte, desde o início da ditadura militar (1964), é que trem exige muito dinheiro público e não dá o mesmo retorno econômico do rodoviário.

Na Europa e na Ásia, investe-se em trens de todo tipo e, especialmente, de alta velocidade por vários motivos estratégicos, não considerados por essa parte da imprensa e pela oposição ao governo Lula. Vamos enumerar alguns deles:

1. Domínio da tecnologia de trens de alta velocidade

Parece pouca coisa, mas é talvez o mais importante benefício indireto para o país. De difícil quantificação, não entra nas contas da avaliação estratégica que deve ser feita ao se optar por esse projeto.

Penso que é indiscutível o fato de que os trens de alta velocidade vieram para ficar e se expandir. Quanto mais escala se tiver e com a inevitável evolução tecnológica, é questão de mais cinco a dez anos e eles serão uma realidade na América do Sul e África.

Assim como o Brasil implantou o projeto Embraer, e com isso concorre com a Boeing e demais fabricantes de aviões em todo o mundo, o governo Lula está escolhendo o projeto TAV Rio-São Paulo-Campinas para dominar a respectiva tecnologia e promover o desenvolvimento industrial e tecnológico necessários para ser o principal protagonista na competição mundial pelos investimentos, projetos, obras e serviços dos TAV.

2. Redução da poluição por emissão de gases poluentes e sonora

Os trens de alta velocidade substituem viagens que normalmente seriam feitas por avião e por veículos movidos à combustíveis de origem fóssil.

Diante do quadro que temos hoje de emissão de poluentes, qualquer redução de 10 a 20% dessas emissões, pela substituição de viagens desse tipo já vale a pena. Esse custo para a sociedade e para o planeta é de difícil mensuração, facilitando a argumentação contra o uso de trens para transporte regional de passageiros.

3. Aumento da segurança para os passageiros

Os trens de média e de alta velocidade são muito mais seguros do que aviões, automóveis e ônibus, nos deslocamentos regionais. Os trens de média velocidade ainda apresentam ocorrência de acidentes. Os de alta velocidade não.

Isso qualquer que sejam as condições meteorológicas existentes!

4. Redução significativa do tempo de viagem para os passageiros

Nos países onde existem trens de alta velocidade, são garantidos os horários de início, de passagem e de fim da viagem. Ao contrário dos aviões, por exemplo, o tempo gasto no embarque e no desembarque é muito pequeno. Além disso, como essas estações estão dentro da cidade e ligadas ao sistema de transporte urbano (metrô especialmente), os tempos e movimentos são muito menores, maximizando o tempo total de deslocamento.

5. Aumento significativo do conforto para os passageiros

Quem já viajou num trem de alta velocidade sabe muito bem a diferença da água para o vinho, em relação ao conforto deste em relação aos aviões, ônibus e automóveis. Os efeitos das forças centrífugas do rodoviário, e das trepidações das turbulências nos aviões ,inexistem nos TAV.

Nestes, as acomodações são confortáveis, o deslocamento é suave e sem ruído, permitindo apreciar a paisagem do entorno da linha ferroviária.

Além disso, que já não é pouco, tem serviço de restaurante e outros complementos na primeira classe, impossíveis de serem fornecidas pelos automóveis, ônibus e aviões.

Finalmente, uma vantagem considerada fundamental para muitos usuários do aeroviário: a possibilidade de uso do telefone celular, durante toda a viagem.

***

Como tentei demonstrar, o projeto TAV Rio-São Paulo-Campinas é muito mais do que uma simples ligação ferroviária entre os dois principais centros econômicos do país. É, antes de tudo, um dos maiores projetos estruturastes para a geração de empregos, tanto na indústria, como em projetos e pesquisas.

Daqui a dez anos, quando olharmos para 2010, com o distanciamento histórico necessário, ficará claro que essa escolha foi acertada e que valeu cada um dos R$ bilhões investidos pelo governo federal no projeto TAV.

Em 2020, será considerada ridícula a crítica hoje feita por parte da imprensa e pela oposição ao governo Lula ao fato de que a iniciativa privada entrará com apenas uma pequena parcela nesse empreendimento, principalmente, quando se considerar que na Europa e na Ásia os governos entram com 100% dos custos.

José Augusto Valente é Diretor Técnico do T1

Originalmente publicado no Blog do Zé Dirceu, em 20/7/2010

O que significa “investimentos aquém do necessário”?

O que mais se lê na imprensa é que “os investimentos em infra-estrutura estão aquém do necessário”.

Normalmente, esse comentário é acompanhado do percentual investimento em relação ao PIB (não se sabe tirado de onde) e a esquisita comparação desse indicador com os de outros países ricos e emergentes.

Insisto que só há uma maneira de saber quais são os investimentos de curto, médio e longo prazo a fazer, especialmente no setor de transportes.

É comparar o que dizem o Plano Nacional de Logística e Transportes – PNLT, do governo federal, e os planos estaduais de igual abrangência, com o que está sendo feito e planejado para os próximos anos por governos e iniciativa privada..

Fazer comparações com outras realidades muito distintas – no tempo e no espaço – da nossa é um erro crasso, que leva a diagnósticos absurdos.

A pergunta que se deveria fazer (mas não se faz), aos que dizem que “os investimentos estão aquém do necessário”, deveria ser a seguinte: quem deveria fazer esses investimentos? O governo federal, os governos estaduais, as prefeituras, a iniciativa privada? A impressão que fica é de que os investimentos são todos do governo federal, não?

Como exemplo, sabe-se que parte dos principais portos brasileiros são da União (Rio, Santos e Vitória, por exemplo), parte de governos estaduais (Paranaguá e Rio Grande), parte de Prefeituras (Itajaí e São Francisco do Sul) e parte exclusivamente da iniciativa privada (Petrobras, Aracruz, Hermasa, Cargill). Logo, cabe a pergunta: quem é responsável pelos investimentos?

É sabido que antes do programa de desestatização de portos e ferrovias a responsabilidade por esses investimentos era totalmente governamental. Mas será que todos sabem que, agora, são das empresas privadas que têm a concessão para exploração/operação desses serviços?

As rodovias de elevado volume de tráfego eram geridas pelos governos federal e estaduais. Será que todos sabem que, agora, são operadas pela iniciativa privada e quem paga pelos investimentos realizados são os usuários, através dos pedágios?

Então, anotem aí, quando alguém falar que “os investimentos estão aquém do necessário” ou que eles “representam apenas 1% do PIB quando nos países ricos é 3%” insista em saber que investimentos são esses, onde devem ser feitos e com base em que estudo a pessoa está se amparando para fazer essa afirmação.

Com certeza ela não saberá responder pois se soubesse não falaria isso.

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

A (suspeita) campanha sistemática contra os portos brasileiros

Sistematicamente, aparecem na imprensa brasileira matérias e editoriais informando ou avaliando os gargalos nos portos públicos do país. Como as catastróficas previsões nunca se concretizam, fica no ar a suspeita de que motivações eleitorais ou comerciais estão por trás dessa campanha permanente.

Matérias sobre “problemas portuários” na exportação de açúcar foram por nós desconstruídas também por carecerem de fundamentação objetiva e apresentarem dados falsos (clique aqui e aqui).

Mais recentemente tivemos o editorial do Estadão, com o título “Portos e aeroportos defasados” (clique aqui). Pelo quadro ali apresentado o caos está estabelecido nos portos públicos. O que está longe da verdade.

Qual o problema dessas informações/avaliações? Elas não estão fundamentadas em fatos objetivos. Porisso levam a diagnósticos equivocados, que não contribuem para melhorar a eficiência da logística brasileira.

Esse editorial do Estadão tem o texto abaixo como centro da sua crítica:

“Indústrias com portos privados – caso da Ford na Bahia – conseguem evitar o congestionamento e a lentidão dos embarques e desembarques. Empresas dependentes de portos públicos enfrentam filas para movimentar seus produtos, porque os terminais carecem de equipamentos, de pessoal e de espaço. Transportar mercadorias por milhares de quilômetros de rodovias pode ser uma alternativa preferível, quando o intercâmbio é com países sul-americanos. Essa é a escolha da Fiat para transportar veículos entre fábricas brasileiras e argentinas, na ida e na volta.”

Vamos aos fatos:

1. A principal empresa “dependente de porto público” é a Fiat. Maior empresa automobilística brasileira, utiliza o Porto do Rio de Janeiro (cerca de 98% da sua movimentação) e sua operadora é a MultiCar (foto), pertencente ao grupo Multiterminais Alfandegados S.A.

2. A MultiCar obteve os mais altos ratings entre terminais especializados no mundo das diversas inspeções de qualidade total efetuadas pelas montadoras que utilizam regularmente o terminal de veículos do Rio.

3. O Prêmio Fiat Qualitas Award, na sua vigésima edição, referente ao ano de 2008, entregue em 2009, distinguiu os fornecedores do Grupo Fiat que mais se destacaram em qualidade, atendimento e gestão, com foco crescente no cliente final.

4. O grupo Multiterminais foi o único fornecedor de logística que se destacou no Prêmio, recebendo reconhecimento pela qualidade de seus serviços, prestados em 2008, ano em que a economia brasileira mais cresceu, até setembro, quando a crise mundial se fez sentir nas exportações brasileiras.

5. A Fiat não foi ouvida para a elaboração do artigo mencionado. Se tivesse sido, com certeza, confirmaria que não há problema no porto público do Rio de Janeiro, por onde escoa a quase totalidade da sua produção.

6. Se tivesse sido ouvida, a Fiat diria que desloca automóveis por rodovia, na rota Minas – Argentina, porque é mais econômico e porque tem carga de retorno. Apenas isso, nada de crise ou gargalo.

A cantilena contra os portos públicos “esquece” que:

a) O PIB brasileiro, em US$ bilhões, saiu de 840 em 1996 para 1.573 em 2008, praticamente dobrando o seu valor no período de 12 anos;

b) a corrente de comércio exterior, também em US$ bilhões, saiu de 101 em 1996 para 371 em 2008, mais que triplicando o seu valor nesse período;

c) o percentual da abertura da economia, que é a relação entre o valor da corrente de comércio e o PIB, passou de 12% em 1996 para 24% em 2008, dobrando o seu valor no período de 12 anos;

d) parece-nos óbvio que esse crescimento significativo do PIB, da corrente de comércio e da abertura da economia só foi possível devido ao adequado nível de eficiência da logística brasileira (envolvendo rodovias, ferrovias e portos), a menos que se invente que os crescimentos do PIB e da corrente de comércio exterior não tenham nenhuma relação com a eficiência da logística brasileira.

Apesar desse nível adequado de eficiência logística, há muita coisa que é possível melhorar, na medida que sempre é possível melhorar o que já está bom.

Um exemplo disso é a adoção do sistema Navis-Sparcs, utilizado por quase todos os operadores portuários de contêineres (nos portos públicos), que garante o agendamento eletrônico das cargas que chegam ou saem dos portos, evitando filas e perdas de tempo.

Esse novo sistema, implantado desde o início de 2009, possibilita a otimização no processo de movimentação de contêineres, resultando em aumento de produtividade nos embarques e desembarques reduzindo o tempo total de operação nos Navios, trazendo benefícios diretos aos armadores que operam no terminal.

Além disto, a diminuição das remoções no pátio e a inteligência adotada pelo sistema possibilita o aumento da capacidade operacional do terminal, gerando um aumento na eficiência na disponibilização dos contêineres. Em paralelo, constata-se a diminuição do consumo de combustível, proporcionando menos emissões de gas carbônico para cada contêiner operado.

Voltando ao início desta análise, fico pensando: qual será o motivo para que não se divulgue os fatos e dados da evolução da eficiência logística do Brasil; eleitoral ou comercial?

José Augusto Valente – Diretor Técnico do T1

Exportação de açúcar em Paranaguá também não é calamitosa

Em análise anterior, sobre a situação da exportação de açúcar (clique aqui), mostrei com dados verificáveis que não há crise portuária em Santos, como veiculado em matéria de capa do Valor Econômico, e em comentário do Sardenberg na Rádio CBN.

Hoje mostrarei que a matéria e o comentário na CBN também se equivocaram em relação ao Porto de Paranaguá.

A matéria do Valor dizia que 28 navios aguardavam na fila do Porto de Paranaguá. Isso no dia anterior ao da publicação, ou seja, em 12/7/10.

Agora já tenho acesso aos dados do porto (clique aqui se vc for cadastrado) e passarei para vocês as informações de hoje (15/7/10).

. Navios ao largo: 43

. Navios ao largo para embarque de açúcar: 17

Como se vê, são apenas 17 navios aguardando para embarque de açúcar e não 28 como diz a matéria. É impossível que a fila tenha reduzido de 28 para 17 navios em apenas três dias.

Em relação a tempo de espera, temos a seguinte distribuição:

. 1 navio com espera de 2 dias

. 3 com espera de 6 a 10 dias

. 7 com espera de 11 a 15 dias

. 6 com espera de 16 a 20 dias

Considerando, como diz a matéria, que é normal uma espera de 12 a 15 dias, podemos afirmar que:

24% dos navios (4 em 17) estão com tempo de espera abaixo da média

41% dos navios (7 em 17) estão na média

Apenas 35% dos navios (6 em 17) estão acima da média

É importante ressaltar que a matéria informa que o tempo de espera – em Santos e em Paranaguá – está chegando a 30 dias. Não é verdade.

O maior tempo de espera em Paranaguá está em 20 dias e, em Santos, 22 dias. No dia 12 era de 17 e 19 dias, respectivamente.

Isso apesar de uma situação excepcional de sobre-demanda internacional por açúcar, combinada com chuvas que obrigam a paralisação do embarque quando ocorrem.

Que situação excepcional é essa?

Como visto em matéria do Valor, publicada neste T1 (clique aqui), os mercados que hoje mais demandam açúcar em regime de urgência são Canadá, Arábia Saudita e o Norte da África. “As refinarias que têm o Brasil como fornecedor costumam manter estoques baixos, pois sabem que no momento em que precisarem, conseguirão produto sem dificuldades. Mas nos deparamos com uma concentração de demanda dessa magnitude e, agora, com chuvas”.

Essa matéria mostra o esforço gigantesco que está sendo feito pelos portos brasileiros para atender essa sobre-demanda

Para se ter uma ideia do quanto os terminais de açúcar forçam seus limites para embarcar o produto, de 1 a 13 de julho, todos os terminais brasileiros embarcaram 1,1 milhão de toneladas, uma média de 86 mil toneladas por dia. Nos 31 dias de julho de 2009, foram exportadas 1,68 milhão de toneladas – 54 mil toneladas diárias, segundo a Kingsman do Brasil.

“Estamos no limite em todo o sistema logístico. As usinas carregam açúcar em caminhões 24 horas por dia, quando o normal é apenas pela manhã. As rodovias também padecem de situação extrema”, disse Souza.

Segundo a Associação do Transporte Rodoviário do Brasil (ATR), que tem foco em cargas do agronegócio, faltam caminhões para levar açúcar das regiões produtoras até Santos.

“Precisaríamos de 20% a 25% mais caminhões para atender toda a necessidade açucareira. Por conta dessa concentração, desde junho os fretes aumentaram 10%”, diz Rogério Martins, diretor da ATR.

Elaborar juízo de valor negativo sobre o sistema portuário brasileiro, com base em situações excepcionais, que dificilmente se repetirão, na minha opinião é má-fé e não ajuda em nada para o diagnóstico correto sobre a logística de granéis, cujo principal problema é a insuficiência de silos, especialmente nas regiões produtoras, para regular o fluxo dessa cargas em direção aos portos.

O BNDES tem uma linha de financiamento para essas estruturas (Moderinfra), mas os embarcadores não têm demonstrado interesse em acelerar as respectivas construção e operação.

Precisamos elaborar diagnósticos bem fundamentados, sobre a logística de granéis e de contêineres, se quisermos cobrar, com rigor, o que cabe aos governos e o que cabe à iniciativa privada.

Fazer política partidária com esse assunto é um desserviço ao país.

José Augusto Valente é Diretor Técnico do T1

A verdade sobre a exportação de açúcar e a falsa “crise” no porto de Santos

Matéria de capa do Valor Econômico de ontem (13/7), com o título “Venda de açúcar cria ‘fila’ de navios e congestiona portos”, gerou vários comentários na internet, cada um mais equivocado do que o outro.

Tudo porque os comentaristas (especialmente o Sardenberg, na CBN) não procuraram se informar, para fundamentar adequadamente seus comentários.

O primeiro erro de informação está na matéria do Valor. No lide, está escrito que “No porto de Santos … a fila chegava ontem (12/7) a 46 embarcações”

Como eu gosto de checar as informações, fui ao site do Porto de Santos (13/7) e cliquei no link “Navios fundeados”. Imprimi a tabela que lá estava e constatei o erro: são 35 e não 46 o número de navios na ‘fila’

O segundo erro (fatal) está no quarto parágrafo: “Com a fila de navios em Santos, o tempo de espera no porto, normalmente de 12 a 15 dias, está chegando a 30 dias”

Não é verdade. Segundo essa tabela coletada ontem (13/7), os tempos de espera apresentam a seguinte distribuição dos 35 navios fundeados, em espera:

. 10 com espera entre 0 e 5 días

. 11 com espera entre 6 a 10 dias

. 11 com espera entre 11 a 15 dias

. 02 com espera entre 16 a 20 dias

. apenas 01 com 22 dias de espera

Como se vê 60,0% dos navios (21 em 35) estão com tempo de espera abaixo da média (12 a 15 dias).

31,4% dos navios (11 em 35) estão com tempo de espera na média

Apenas 8,6% (3 em 35) estão com tempo de espera acima da média.

Logo, não há crise alguma no porto de Santos, apesar da excepcional situação observada. Fato que dificilmente se repetirá, como ocorreu em 2003 em relação à conjuntura da soja no mercado internacional. Trata-se de problema conjuntural e não estrutural como querem alguns comentaristas e a matéria do Valor.

Com base em dados disponíveis, conclui-se então que a matéria não tem fundamentação.

Considerando isso, todos os juízos decorrentes são falsos, tanto na própria matéria do Valor como, principalmente, nos comentários encontrados na internet (em especial o do Sardenberg na CBN).

José Augusto Valente é Diretor Técnico da Agência T1

Ouça, abaixo, os comentários do Sardenberg, ontem, na Rádio CBN