Este post destina-se às pessoas que leram o artigo acima citado, no Valor Econômico (para assinantes) ou no “site de clipping” do Ministério do Planejamento.


1. O primeiro comentário é de fundo e está postado no Blog do Nassif, sob o título “O Plano Nacional de Logística” (texto de minha autoria).


Em resumo, digo que não tem porque fazer comparações do Brasil com outros países não só pelas enormes diferenças e peculiaridades existentes como porque, no nosso caso, existe um Plano Nacional de Logística e Transportes – PNLT, que tive a honra de coordenar quando Secretário de Política Nacional de Transportes/MT, em 2006/2007.


Existe, portanto, um Plano estratégico e ele orienta o PAC de Logística e o PPA 2008-2011. Qualquer coisa fora disso tem que ser muito bem fundamentado, o que não é o caso quando se compara o Brasil com outros países.




2. O articulista diz que o crescimento da infra-estrutura gera o crescimento da economia (PIB). Há que ter cuidado com essa afirmação. Normalmente, a infra-estrutura é projetada e implantada para atender a uma demanda (previsível) do crescimento da economia. E isso não ocorre uniformemente em todas as regiões do país. Nos últimos anos, o crescimento da economia na Região Nordeste tem sido em “ritmo chinês”, enquanto no Sul-Sudeste tem sido bem mais moderado.


O PNLT analisa essas situações e a partir da evolução da produção e do consumo – combinada com as políticas do governo federal de desenvolvimento regional, entre outras – são estudados os fluxos de cargas por modalidade e na intermodalidade.


É isso que determina se precisa de mais rodovias ou hidrovias e de que porte.




3. Outro deslize comum é o encontrado no artigo quando compara percentual de investimento do PIB nas décadas de 70 e 80 com os da década de 2000. Quem faz essa comparação se esquece de que nas décadas de 70 e 80 os investimentos em infra-estrutura de transportes eram provenientes, quase exclusivamente, do Orçamento da União.


A partir da década de 90, com a política de privatizações dos presidentes Collo, Itamar e, principalmente, Fernando Henrique Cardoso, grande parte dos investimentos que eram feitos pela União passaram a ser feitos pela iniciativa privada.


Desde 1996, todos os portos públicos são operados por empresas privadas. Que vêm alocando significativos volumes de recursos na expansão, modernização e aumento da eficiência de suas operações. O que garantiu – junto com alguns investimentos públicos e com o Reporto – atender ao acelerado aumento da corrente de comércio exterior brasileiro, passando de US$ 101 bilhões em 1996 para US$ 371 bilhões em 2008. Ou seja, um crescimento de 370%!


Além da descentralização via privatização, arrendamento e concessão, aqueles governos a fizeram, também, para governos estaduais e municipais. Os portos de Itajaí (SC) e São Francisco do Sul (SC) foram transferidos para as respectivas prefeituras. Os de Paranaguá (PR) e do Rio Grande (RS) para os respectivos governos estaduais. Há outros exemplos como esses.


Então, quem quiser fazer comparação deste tipo, tem que computar todos os investimentos – públicos e privados, federais, estaduais e municipais – e não somente os da União. Ainda assim, tenho dúvida de que haverá alguma utilidade prática.


Insisto que trabalhos como o PNLT, e outros planos estratégicos realizados por governo estaduais, têm muito mais consistência do que o discurso genérico de percentual de investimento em épocas diferentes, de diferentes momentos da formação histórica brasileira.




4. A afirmação do articulista de que “O transporte rodoviário é responsável por mais de 60% da movimentação da produção, mas 70% das rodovias são ruins ou péssimas” não tem fundamentação em estudo algum. Trata-se de uma das mais difundidas e equivocadas afirmações feitas ao longo dos últimos quatro anos.


Imagino que ele se baseia na Pesquisa Rodoviária da CNT, assunto que temos debatido abundantemente neste blog.


Para criticar essa afirmação, utilizo a mais recente Pesquisa da CNT (2009).


Mas o leitor ou o pesquisador não pode ficar no release da CNT. Tem que ir lá nos Relatórios para extrair as informações que mostrarei a seguir.


***


Foram avaliados 89.552 km, sendo cerca de 50.000 km de rodovias federais e o restante de rodovias estaduais.




I. Pavimento (Pag. 33)

a) Condição de Superfície

94,3% não apresenta buraco

Apenas 5,7% apresenta buraco

43,4% totalmente perfeita

b) Velocidade devido ao pavimento

95,3% não obriga a redução de velocidade

c) Pavimento do acostamento

83,3% pavimentado e perfeito




II. Sinalização (pág. 38)


a) Sinalização horizontal com boa visibilidade:


75% das faixas centrais 


64,3% das faixas laterais




b) Placas verticais:


70,2% apresenta placa de velocidade


68,5% apresenta placa indicativa


73,4% das placas com boa visibilidade, sem mato cobrindo


64,8% têm ótima legibilidade e 33,6% parcial




III. Geometria da via (pág. 48)


88,9% das rodovias são de pista simples


Por esse motivo, essas perdem muitos pontos na avaliação da CNT, cuja rodovia ideal (são exceções no mundo todo) é de pista dupla, com canteiro central largo, com curvas de raios grandes e rampas suaves, independentemente do volume de tráfego.


É essa avaliação que joga as notas das rodovias para baixo, já que o pavimento e a sinalização são bons e ótimos em grande parte das rodovias.


É essa distorção – sem fundamento técnico em qualquer país do mundo – que leva pessoas como o autor do texto dizer que 70% das rodovias são ruins ou péssimas. No que ele está sendo mais realista que o a “rainha” CNT que diz na página 137:


“O levantamento mostra um cenário global ainda desfavorável da infraestrutura rodoviária, com 69,1% da extensão pesquisada (61.839 km) apresentando problemas de pavimento, sinalização e/ou geometria viária.


O Relatório da CNT fala “apresentando problemas”. Quem se der ao trabalho de estudar os critérios de avaliação da referida pesquisa verá que nota global inferior à 81 vai para o rol do “regular, ruim ou péssimo”, ou seja, “apresenta problemas”. 


A nota global é a média das notas de pavimentação, sinalização e geometria. Como todas as rodovias de pista simples – por melhor que estejam – receberão nota inferior a 70 em geometria, ainda que tenham notas altas em pavimentação e sinalização, como consequência, terão média inferior a 81 e irão para o “purgatório“.


(Clique aqui e leia tudo o que já publicamos sobre a Pesquisa Rodoviária da CNT)


No post seguinte, continuarei a comentar este artigo, já que considero haver, no restante do texto, outras afirmações e juízos sem fundamentação na realidade.


***


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