Sem alarde, o governo deve mudar uma das principais obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na área de ferrovias e avalia ainda mexer em regras básicas do setor.
O assunto tem sido tratado nos bastidores e coloca em lados opostos a Casa Civil e o Ministério dos Transportes.
No centro da discussão está o Ferroanel de São Paulo, empreendimento orçado em cerca de R$ 1 bilhão, que, por ora, deverá ser engavetado, embora seja uma das obras do PAC.
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Na verdade, a solução a ser dada para o Ferroanel de São Paulo é o que menos importa, já que ela virá, qualquer que seja, porque interessa ao governo federal, à concessionária, ao governo de São Paulo, à prefeitura de São Paulo, aos usuários, etc.
O importante, na minha opinião, é re-discutir os contratos, garantindo os direitos adquiridos pelas concessionárias. Há quem diga que as concessionárias não querem isso. Penso ao contrário. Se sentarem todos os atores numa mesa de negociação sairá alguma solução melhor do que temos hoje.
Há muita margem para essa re-discussão, na medida em que o modelo adotado é considerado insatisfatório por todos.
Para começar, poderia ser retirada da obrigação das concessionárias a manutenção da via permanente. Passaria a ser uma atribuição da VALEC, que tem atribuição institucional para tal e fôlego executivo, já que hoje constrói a Ferrovia Norte-Sul, com eficiência.
Com isso, a infra-estrutura não seria mais exclusiva das concessionárias, embora fosse mantida a prioridade de operação delas. Qualquer operador ferroviário, constituído ou a constituir, poderia utilizá-las, mediante taxa a ser destinada à VALEC ou ao DNIT, para custear a manutenção. Só precisaria combinar com o Ministério da Fazenda que resiste – com alguma razão – à vinculação de recursos.
Para não prejudicar as operações das concessionárias existentes, elas teriam prioridade na utilização do que é, atualmente. “a sua malha”. Mas a VALEC controlaria o tráfego e garantiria as janelas necessárias para os demais operadores.
No caso de tráfego elevado, que colocasse em risco a operação da atual “dona da malha”, a VALEC, juntamente com o DNIT, providenciaria a implantação de pátios ou outras soluções de engenharia para resolver esse problema.
Seria eliminado o pagamento do arrendamento pelas concessionárias, já que a malha não seria mais delas e sim da União.
Com essa economia, as concessionárias assumiriam o compromisso de investir mais em vagões e locomotivas, para dar conta da demanda de movimentação das “commodities”.
A União – através da VALEC e do DNIT – assumiriam resolver todos os problemas de travessia urbana, em nível, e os problemas decorrentes da ocupação da faixa de domínio, dois dos principais problemas que impedem o aumento da eficiência do modal ferroviário.
Essas modificações, mais o atual programa de expansão e modernização da malha ferroviária nacional (Norte-Sul, Nova Transnordestina), garantiriam um novo patamar de qualidade do serviço ferroviário de cargas.
Tudo isso e mais o programa que iniciamos, à frente da Secretaria de Política Nacional de Transportes, de resgate dos trens regionais de passageiros – e que se encontra em fase de estudo de viabilidade de quinze trechos -, mais os trens turísticos e mais o trem de alta velocidade Rio – São Paulo – Campinas, permitiria alcançar uma nova fase de sucesso do modal ferroviário, que foi abandonado desde 1964, em detrimento do rodoviário.
Como financiar tudo isso?
a) com a taxa de utilização da via, a ser paga por todos os operadores, a União teria recursos para as obras de manutenção permanente;
b) a abertura de licitação para novos operadores ferroviários, com valor de outorga, garantiria os recursos para resolver os gargalos de travessia urbana e ocupação das faixas de domínio;
c) com o avanço do programa de concessão e de PPPs rodoviárias, mesmo que sem valor de outorga, haveria um alívio na pressão por recursos orçamentários para esse fim, sobrando mais recursos a utilizar no modal ferroviário, para obras de melhoria de traçado e de contorno de cidades;
d) embora seja mais difícil do que em rodovias, as PPPs ainda podem ser uma alternativa a explorar para financiar a expansão da malha ferroviária e obras de maior vulto como o Ferroanel de São Paulo;
e) finalmente, há quem defenda – e é uma alternativa a analisar – que concessões rodoviárias ainda por licitar poderiam incluir valor de outorga com destinação explícita para obras do modal ferroviário.
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